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Herd of cows walking through the countryside in Riberalta - Bolivia

Pasto ocupa 75% da área desmatada ilegalmente em terras públicas na Amazônia, mostra estudo

Quantidade de CO2 lançado na atmosfera nas últimas décadas pela prática da grilagem equivale a cinco anos das emissões nacionais de gases causadores do efeito estufa

CRISTIANE PRIZIBISCZKI, no O Eco

As áreas de pastagem ocupam 75% do que foi desmatado em florestas públicas invadidas da Amazônia no ano de 2020, o que corresponde a cerca de 2,6 milhões de hectares, aponta estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). O trabalho, lançado na última semana, às vésperas da Conferência do Clima da ONU, mostra o avanço do desmatamento nessas áreas nas últimas décadas e seu peso para o agravamento das mudanças climáticas.

O trabalho revelou que mais da metade dos desmatamentos nas florestas públicas não destinadas (52%) ocorreram nos últimos 10 anos. “O desmatamento ali vem crescendo, confirmando que, em boa medida, a grilagem avança sem controle na região”, diz trecho do trabalho. De fato, nos últimos dois anos (2019 e 2020), o desmatamento em terras públicas correspondeu a 44% do total derrubado anualmente. 

Segundo o relatório, entre 1997 e 2020, um total de 21 milhões de hectares de floresta foram destruídos, o que corresponde a 8% dos 276,5 milhões de hectares de florestas públicas existentes na Amazônia Legal. A área é maior do que o estado do Paraná.

A emissão de gases estufa associada a essa destruição chega a 10,2 gigatoneladas de CO2. O valor corresponde a cinco anos das emissões nacionais de gases estufa no Brasil.

A nova análise do IPAM mostra que a conversão de floresta em pasto é regra em terras devolutas e florestas não destinadas, muitas vezes seguida por um Cadastro Ambiental Rural (CAR) irregular, numa tentativa de emular posse da terra para venda ou para usufruto.

Atualmente, existem 16 milhões de hectares de florestas públicas não destinadas declarados como propriedade privada dentro do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural, e 15,2 milhões de hectares nas outras terras não destinadas (áreas públicas de floresta que ainda não constam no cadastro nacional do Serviço Florestal Brasileiro). 

“A grilagem é um fator de risco para o equilíbrio climático do planeta, e ainda carrega para o setor da pecuária dois problemas: ilegalidade e mais emissões de gases do efeito estufa”, diz o pesquisador sênior do IPAM, Paulo Moutinho. “Uma economia verdadeiramente de baixo carbono no Brasil precisa passar por uma análise ampla sobre o impacto das cadeias produtivas no agravamento do efeito estufa. Deixar essas emissões de lado não faz sentido quando temos uma emergência climática em curso”, alerta.

Terras indígenas e unidades de conservação, ainda que sob intensa pressão, mostraram os menores índices de desmatamento: somente 1% e 2% de suas áreas totais, respectivamente, foram convertidas para outros usos até 2020.

Recomendações

Os números trazidos pelos pesquisadores do IPAM somam-se à grande lista de resultados negativos que o Brasil carrega consigo para a Conferência da ONU sobre o Clima. 

Com um dos resultados mais esperados do encontro sendo a regulamentação do mercado de carbono, a publicação de dados sobre ocupação irregular de terras públicas cai como uma bomba.

“Se o Brasil quiser se mostrar como destino de investimentos em projetos de REDD+ [Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal], por exemplo, precisa fazer a lição de casa. Isso significa necessariamente acabar com o desmatamento, começando por proteger as florestas públicas e combater a grilagem de forma definitiva”, afirma Moutinho.

Além disso, os autores também lembram do papel fundamental que a cadeia da pecuária tem no processo de desmatamento da Amazônia, no qual o setor privado ganha relevância.

“É claro que o combate à grilagem e a proteção das terras públicas é responsabilidade do governo. Mas o setor privado pode ser determinante para a mudança ao fechar as portas para a ilegalidade”, defende Caroline Salomão.

Esta reportagem foi, originalmente, publicada no O Eco, em 1 de novembro de 2021.

Imagem: Depositphotos

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